domingo, 29 de janeiro de 2012

O Brasil será capaz de reduzir as tragédias causadas por desastres naturais?

Quando se fala em tecnologia de prevenção de desastres, o Brasil está atrasado em relação aos países desenvolvidos, que contam com sistemas eficientes para prever furacões ou conter os danos de grandes terremotos. Por aqui, eventos extremos como esses são raros, mas as fortes chuvas de determinadas épocas do ano continuam provocando tragédias. A maior da história do país ocorreu na região serrana do Rio, em janeiro passado, quando mais de 900 pessoas morreram. O desastre fez com que o governo prometesse agir para tentar acabar com o caos. Hoje, um ano depois, o trabalho começou, mas ainda está longe de terminar.
A partir de 2011, o Brasil começou a investir em um sistema de prevenção e alertas à população, o que não existia até então. Em meados de janeiro de 2011, o governo federal anunciou a criação do Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), para começar a funcionar já no período de chuvas de 2012. A estrutura do centro foi criada em junho, e em dezembro o centro entrou em operação 24 horas por dia.

"O objetivo do centro é principalmente salvar vidas, e também evitar prejuízos", explica o climatologista Carlos Nobre, coordenador do Cemaden. No momento, o centro utiliza informação de chuvas em áreas sujeitas a deslizamentos em 56 municípios das regiões Sul e Sudeste, e vai expandir as operações para mais 34 municípios do Nordeste em abril, quando as chuvas caem mais forte na região. Em 2012, mais 2,8 mil pluviômetros e quatro radares (para operar na Bahia, no Espírito Santo, em Alagoas e São Paulo) devem entrar em operação. O plano é que em quatro anos o sistema esteja operando em todo o país.
O pequeno número de municípios sob observação por enquanto é explicado pela falta de recursos aplicados no início do projeto. Segundo Nobre, foi preciso fazer uma escolha. "Em vez de esperar comprar todo o equipamento, nós resolvemos iniciar as atividades com o material existente e, a partir daí, melhorar. Se já temos informações sobre algumas áreas de risco, começamos por elas", diz.
O trabalho do Cemaden é usar tecnologia para emitir alertas dos locais onde podem ocorrer problemas. Pluviômetros, imagens de satélites, radares meteorológicos e outros equipamentos são utilzados para gerar informação sobre áreas de risco de enchentes ou deslizamentos. Segundo Nobre, as cidades que mais sofreram com as chuvas nesse começo de 2012, como as da grande Belo Horizonte e da região serrana do Rio, já estão recebendo alertas para atuar na prevenção de tragédias fatais.

Projetos como esse também estão sendo criados na esfera municipal. Um projeto pioneiro é o Centro de Operações Rio, que foi implementado em 2011 e é referência no uso de tecnologia para enfrentar os danos causados por fortes chuvas. O centro é fruto de uma parceria da prefeitura do Rio com a IBM, e conta com com tecnologia de ponta para monitorar as condições climáticas no município do Rio. Além disso, um trabalho integrado com 30 órgãos do município permite acionar com rapidez equipes do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil em caso de desastres.

"Hoje, somos a cidade mais monitorada do país. Temos a possibilidade de visualizar a chuva e as consequências, e o monitoramento da chuva é feito em tempo real com a leitura dos mais de 100 pluviômetros que enviam informações à central", diz Sávio Franco, chefe executivo do centro.
Franco explica que o Centro de Operações Rio só monitora a capital carioca, e portanto não emite alertas para áreas que estão enfrentando as chuvas mais fortes esse ano, como a região serrana. Mas há muitas áreas de risco na cidade, o que levou à instalação de um sistema de sirenes em cerca de 66 comunidades cariocas que apresentam risco de deslizamento. "Estamos ainda em um processo de aprendizagem, mas ter um equipamento que permita uma ação mais rápida em momento de crise, que mobilize suas equipes em tempo real e que informe a população sobre o que está acontecendo certamente é um diferencial que pode ajudar a salvar vidas e minimizar os impactos negativos", diz Franco.
O diferencial pode ser verificado com números. Em países como o Japão, o número de vítimas de um desastre é muito menor que em países com níveis de desenvolvimento inferior. "Sem um sistema de monitoramento, um desastre natural causa dez vezes mais mortes. A experiência internacional mostra que, com um sistema de alerta, em poucos anos se pode reduzir em até 80% o número de mortes", diz Nobre.
A cultura da prevenção ganhou um reforço no Brasil a partir de 2011, mas ainda é possível ver que a atenção do governo para o assunto continua sendo despertada pelas tragédias, um traço da cultura reativa aos desastres que prevaleceu por décadas. Em 9 de janeiro, depois que Minas Gerais e o Rio já tinham registrado problemas com as chuvas, a presidente Dilma Rousseff determinou a criação de uma Força Nacional de Apoio Técnico de Emergência, da qual fazem parte 35 geólogos e 15 hidrólogos. 
O maior desastre natural da história do Brasil serviu para mobilizar setores do poder público, que passaram a pensar em prevenção de desastres naturais. Ainda assim, as mortes em Minas Gerais e no Rio de Janeiro nas primeiras semanas de 2012 mostraram quão longe o país ainda está de chegar ao nível dos países desenvolvidos. A ocupação irregular do solo, a falta de fiscalização por parte dos governos municipais, a preparação precária ou inexistente da população para eventos extremos e a fragilidade da defesa civil são fatores que ainda precisam de investimentos e ações duradouras. Só assim o Brasil será capaz de reduzir as tragédias que se repetem ano após ano.

Nenhum comentário:

Postar um comentário